segunda-feira, 14 de junho de 2010

Anakin Skywalker







Um dos temas que eu desejo abordar, e agora tenho a oportunidade de fazê-lo, é falar sobre Anakin Skywalker.


Longe de plagiar a Joseph Campbell, cuja obra para um entendimento mais filosófico de Star Wars inspirou George Lucas (eu recomendo O Herói das Mil Faces de 1949), não pretendo dissertar sobre os mesmos pontos e análises observadas por ele, nos muitos mitos da história humana das culturas espalhadas pelo mundo.
No estudo de Campbell, todos os mitos e expressões dos vários povos, ao longo do tempo, apresentam semelhanças no que se refere à figura do herói. Em uma análise mais aprofundada, tanto na mitologia grega, na mitologia nórdica, nas cosmologias de povos celtas, e nas visões de mundo de povos ameríndios, os heróis sempre possuem algumas características e atributos que lhes são comuns, e que surpreendentemente parassem derivar em si.
Em Star Wars não é diferente. Levando-se em conta que a maior obra de George Lucas, além de ser uma bela peça da sétima arte voltada à ficção científica e fantasia, uma Ópera Espacial sem precedentes em mesmo calibre, criou-se uma mitologia moderna, que espelha o que sempre existiu no coração e na mente do homem. De uma forma futurística, Star Wars retrata os mesmos dramas da humanidade, assim como a mitologia grega, por exemplo, fez ao falar sobre a sociedade através do imaginário, do mágico e do religioso. Anakin Skywalker é a parte desta Mitologia Ocidental Moderna, que de forma fenomenal, narra o homem e sua sociedade.
Em Paralelos, desejo descrever a minha visão sobre Anakin Skywalker, traçando alguns paralelos com a religião e a mitologia, e em alguns casos com fatos reais, onde pessoas reais incorporaram os traços do Herói de Mil Faces, que Campbell descreveu.
Anakin Skywalker é um personagem que agrega em si vários personagens históricos, personalidades, personagens mitológicos e figuras religiosas. A junção destes elementos forma o personagem, que é sem dúvida o ponto central de toda a Saga de Star Wars. Vejamos alguns destes elementos:

O Nome:
Anakin é um nome que pode traçar sua origem em três línguas: O Sânscrito, o Hebraico e o Grego.


Em sânscrito, o nome pode ter dois significados, (1) “guerreiro”, ou (2) “Sem Igual”.
No caso do hebraico, Anakin teria uma pequena diferença gráfica no aportuguesamento: “Anaquim”. Segundo a Bíblia, Anakin era o nome de um povo que habitava a região de Canaã, durante o período do Êxodo. Os Anaquins, ou Enaquins, possuíam uma particularidade. Eram gigantes, homens de estatura superior a dois metros e meio, chagando a três metros. Foram combatidos pelos exércitos de Israel, comandados por Josué ben Num, o conquistador. O último bastião dos Anaquins foi a cidade de Hebrom (na época se chamava Quiriate-Arba), onde o conquistador Calebe ben Jefoné (ótimos nomes para colocarem em seus filhos). Os tribo dos Anaquins foi conquistada e seus remanescentes se mudaram para as cidades costeiras ao Mediterrâneo, onde se associaram aos filisteus. Um dos exemplos destes descendentes é o famoso Golias, que lutou com Davi, futuro rei de Israel. Golias era radicado em Gate, umas das cidades da federação de estado filisteus.

Outra origem para o nome de Anakin, poderia ser do grego. Anakin seria um nome composto, dividido pelo sufixo “Ana”, que significa “sem” ou “ausência de”, e a partícula “Kin”, que significa “pai” ou mais precisamente “parente”. Sendo assim, Anakin significaria literalmente, “Sem Parente”, o que dá indicação de sua história de vida e seu misterioso nascimento sem pai.

The Choose One:

A Profecia do Escolhido é uma parte da mitologia de Star Wars que bebe da fonte de outras mitologias, mas também das religiões e em fatos reais. Segundo a perspectiva de Joseph Campbell, o Herói aglomera em si características comuns entre os vários personagens, heróis, ilustres e notáveis de ao longo da história dos povos.
A figura de Anakin Skywalker, como o Escolhido, tem como paralelos aspectos messiânicos de quatro grandes religiões, o Zoroastrismo, o Mitraísmo, o Judaísmo e o Cristianismo. Aliás, a figura de um “Salvador”, alguém que virá e trará a inauguração de uma nova era justiça e paz, ou alguém que trará uma mudança drástica na ordem vigente, a libertação, ou purificação da sociedade, é uma característica presente em várias religiões, principalmente em crenças mais primitivas e algumas religiões tribais espalhadas pelo mundo, sem considerar obviamente as grandes religiões universais.

Em ordem cronológica, podemos traçar as semelhanças entre estas religiões:
Zoroastrismo: O Zoroastrismo, ou Mazdeísmo, é uma das religiões mais antigas do mundo, com mais ou menos três mil anos de história e desenvolvimento. É uma religião que não se define nem como politeísta e nem monoteísta. Apesar de Zoroastro, antigo sacerdote e profeta persa, ter reformado a antiga fé iraniana, que se assemelhava muito ao bramanismo hindu, o Zoroastrismo ainda conservava grande parte de seu panteão. Mesmo admitindo que Ahura-Mazda seja o único deus a ser adorado, indicando um monoteísmo ético, na verdade o Zoroastrismo admite também um outro deus, um deus do mal, uma contra-parte de Ahura-Mazda, seu nome é Arimã, ou Angra Mainyu. Ambos, são auxiliados por uma diversidade de deuses menores que não são adorados. Entretanto, posteriormente, antigos sacerdotes reintroduziram antigos deuses associados a conceitos filosóficos de Zoroastro. Entre eles está Mithra, que ganhou importância tal que acabou por ser tornar uma nova religião.
Dentre as muitas doutrinas do Zoroastrismo, uma delas se destaca em particular. A concepção do Messias, como no judaísmo e no cristianismo. Na antiga religião persa, o salvador (Saoshyant) viria a cada Mil anos, para preparar a humanidade para a própria chegada de Ahura-Mazda (as vezes é o próprio Zoroastro), que virá quando se completarem nove mil anos (dentro do calendário zoroástrico).
A semelhança de Anakin, o Saoshyant, nascerá sempre de uma virgem, que neste caso, entrou em um lago, engravidou e deu a luz um homem. Esta é a primeira característica do herói messiânico. Um nascimento virginal e miraculoso, assim como ocorreu com Shmi Skywalker.
Mitraísmo: Apesar de Mithra ser adorado como uma divindade na Índia (a conexão com a Índia e a Pérsia se dá pelo fato de que os dois povos tem a mesma origem, Indo-Ariana, portanto o compartilhamento das mesmas divindades em religiões diferentes) , muito antes da formalização da religião, o Mitraísmo foi uma derivação do Zoroastrismo.
No zoroastrismo, Mithra era uma das divindades auxiliares de Ahura-Mazda, fazedor do bem, juiz das almas e associado a luz. Apesar de incorporado ao zoroastrismo, seu culto era mal visto pelo fato de haver sacrifícios de touros, o que no zoroastrismo não é aceito. Durante o período helenístico e o Império Romano, o Mitraísmo se tornou muito popular, principalmente entre os militares, e se tornou uma religião separada do zoroastrismo e do hinduísmo.
Por ser associado a luz, seu culto se tornou um culto Solar, a adoração do sol, sincretizou-se com o culto de Zeus, Júpiter e do próprio imperador romano. No zoroastrismo do período do Império Persa (os Aquemênidas), Mithra era o filho direto de Ahura-Mazda com a deusa Anahita, que era se confunde por vezes com uma virgem terrena. O culto era executado em segredo e havia sacrifícios de touros. No mitraísmo, o Saoshyant é o próprio Mithra, que viria a Terra por meio de um nascimento virginal.
Mas alguns elementos importantes são tomados para formar o personagem de Anakin Skywalker: (1) Mithra possui o título de “O Escolhido”, como salvador do mundo e posteriormente, protetor do Império Romano (Darth Vader?); (2) é considerado o “deus do Equilíbrio e da ordem do Cosmos” (vocês lembram-se do quê?); (3) seu poder é destinado à manutenção deste equilíbrio cósmico, mantendo o bem e combatendo o mal. Para o mitraísmo e o zoroastrismo, o equilíbrio está na perpetuação do bem e a extinção das obras de Arimã e do mal na Terra. Assim como a profecia jedi dizia que “O Escolhido” traria o equilíbrio a Força, Mithra possuía a mesma missão messiânica.
Judaísmo e Cristianismo: Anakin também empresta elementos do judaísmo e principalmente de Jesus Cristo, no entanto, ao contrário do que se pode imaginar, o messias judaico-cristão tem menos ligação com a criação do personagem do que o deus Mithra.
No que pese a afirmação acima, o nascimento virginal e miraculoso de Anakin Skywalker, como vimos em “A Ameaça Fantasma”, nos remete imediatamente a pessoa de Maria (Shmi) e Jesus (Anakin). Entretanto a semelhança termina aí. Alguns podem pensar que a visão do Equilíbrio da Força também é uma referência a Paz conseqüente que o Messias trará ao mundo. Entretanto, tal comparação não procede, pois para o Judaísmo e o Cristianismo, a luta do mal não gera equilíbrio, mas sim, promove a total aniquilação do mesmo, pendendo a balança para o bem, para Deus, para a total e absoluta vitória da Divindade e de seu Reino, trazendo a extinção da dor, morte, lágrimas, pecado e do próprio Satanás, o adversário. É mais difícil encontrar um paralelo somente no Judaísmo, além do fato de que o Messias nascerá de uma virgem, já que, assim como no cristianismo, o messias também tem a missão de restaurar o Reino de Israel e restabelecer a Casa de Davi ao trono judeu.


Redenção Filial:
Uma das características de Anakin e da construção de seu personagem, como um arquétipo moderno do herói. É a queda e a redenção, ou salvação por parte de um filho, ou filhos. Anakin, depois que passa pelo caminho do Lado Negro da Força (a queda), experimenta a redenção por meio de seu filho, Luke Skywalker. Essa é uma das características do herói presentes na Saga de Star Wars. O filho duela com seu pai, mas sua intenção é salvá-lo do terrível imperador. Luke sabe que existe bondade no interior de Darth Vader, e que o Imperador não conseguiu extrair o bem por completo. Luke apela para os sentimentos de seu pai para trazê-lo de volta ao lado luminoso da Força. Assim ele resgata seu pai, o redime e o vinga.
Nas mitologias antigas, alguns deuses e semideuses possuíam filhos, dos quais alguns são salvos de alguma maldição, sina, ou complô de outros deuses. Alguns exemplos são:
Osíris: Divindade egípcia ligada originalmente a agropecuária, governador do Egito (da Terra), e deus da fertilidade, tornou-se deus do mundo dos mortos e seu governante. Osíris era filho do céu e da terra, irmão de Set, Néftis e Ísis, sendo esta última também sua esposa. Set, governador do deserto, posição que não lhe agradava, movido por inveja, planejou matar o seu irmão e assim tomar o seu lugar. Set prendeu Osíris em um sarcófago e o lançou no Nilo. Ísis, ao saber do desaparecimento do marido, foi em sua busca e o resgatou, escondendo-o em um campo de papiros. Mas Set descobriu o fato e, com ódio do irmão, o esquartejou em 14 pedaços, e os espalhou por todo o Egito. Ísis e Néftis saíram novamente e juntaram as partes de Osíris, o mumificaram, e Ísis transformando-se em um milhafre, reviveu seu marido, unindo-se sexualmente a ele e dando origem a um filho, Hórus. Hórus, o deus com cabeça de falcão, vinga o pai e derrota Set, enviando-o de volta ao deserto. Assim, Hórus salva o pai e lhe restaura a dignidade. Osíris passa a ser o Senhor do Mundo dos Mortos, enquanto seu filho assumiu o governo do Egito.
Anakin se assemelha a Osíris no seu processo de redenção. Tal como o deus egípcio, Anakin passa pelo processo da queda, figurativamente a morte, sendo vingado por Luke (Hórus), que lhe resgata das mãos do Imperador (Set), e mesmo após a morte assume seu lugar entre os jedi no mundo espiritual da Força. Luke, por sua vez, assume a Ordem Jedi (o Egito), tornando-se o seu novo líder.
Zeus e Heracles: Filho ilegítimo de Zeus com a humana Alcmena, Heracles, ou Hércules para os romanos, foi alvo da vingança de Hera, rainha dos deuses e esposa de Zeus. Desde a infância, a enciumada Hera procurou matar a Heracles com o intuito de atingir o marido. Porém em outras ocasiões, ela lhe apresentava desafios por demais difíceis (Não confundir com os 12 Trabalhos de Heracles). Mas como ele sempre vencia seus desafios e lograva êxito em suas aventuras, aos poucos foi caindo nas graças de Hera e assim redimindo seu adúltero pai perante sua esposa irada. No sacrifício final de Heracles, Zeus o arrebatou para o Monte Olimpo e lhe deu um lugar entre os deuses, além de uma esposa, Hebe.
Ao passo que Anakin nunca traiu Padmé, o mito de Heracles na verdade apenas mostra as semelhanças entre a condição dos pais e dos filhos nas mitologias antigas. Heracles assume o lugar de Luke, enquanto Anakin é o próprio Zeus.

Anakin Skywalker, em sua trajetória até a sua união com a Força, passa por um ciclo completo, salvo algumas etapas, que Joseph Campbell chama de “Os Doze Estágios da Jornada do Herói”, onde esta jornada é chamada de “Monomito”. O Monomito, em modo geral, é comum a todas as histórias dos heróis, tanto reais como mitológicos, como já afirmado anteriormente.